Empresa de ônibus apoia projeto cultural desenvolvido por um de seus funcionários.
Iniciativa já conta com mais de dois mil livros doados e disponíveis para leitura dentro dos coletivos.
A ideia de um cobrador de ônibus transformou mais de 180 coletivos da viação Piracicabana, de Brasília, em verdadeiras estantes de livros itinerantes. Cerca de dois mil exemplares dos diversos gêneros da literatura estão disponíveis aos mais de 100 mil passageiros que passam por dia nos veículos. A ação se
tornou um sucesso e a expectativa da empresa é de expandir o projeto para todos os 517 veículos que compõem a frota.
O projeto “Cultura no ônibus” surgiu em 2003 por iniciativa do cobrador Antônio da Conceição Ferreira. “Levei um livro para o ônibus e notei que passageiros ficavam curiosos com a obra em cima da caixa de cobrador. Percebi que aquilo poderia ser um diferencial na viagem que os usuários faziam todos os dias”, relembra. “Capitães da Areia”, de Jorge Amado, foi a primeira obra que estimulou Antônio a criar o projeto. Em pouco tempo, a ideia ganhou forma, volume e apoiadores. Os próprios passageiros passaram a doar livros para Antônio, e foram tantos exemplares que ele não tinha mais onde guardá-los. “Eu pagava do próprio bolso o aluguel de um espaço para armazenar os livros”, conta.
INCENTIVO DA EMPRESA
Com a dificuldade financeira em manter os livros em um espaço alugado, Antônio levou o projeto para conhecimento da empresa Piracicabana, que viu potencial na iniciativa e garantiu suporte para que Antonio pudesse continuar levando cultura dentro dos coletivos. “Uma pequena sala foi criada para que pudesse guardar os volumes, e ele foi dispensado de sua função como cobrador para se dedicar integralmente ao projeto”, explica Melissa Benter, coordenadora de Recursos Humanos da empresa.
Em seguida, foraminstaladas estantes de plástico nos coletivos, ao lado da catraca, para acomodar os livros. “Os passageiros olhavam curiosos e alguns chegavam a perguntar se os livros estavam ali para ser vendidos”, conta Antonio, que respondia enérgico: “Não, é para ler”. O empréstimo de livros é bem simples, e Antônio faz questão de frisar que não existe qualquer burocracia.
“é tudo na base da confiança”, afirma. Ele explica que faz o processamento dos exemplares em sua mini-biblioteca e separa aqueles que vão ser colocados nos coletivos. “Não existe um cadastro. A pessoa simplesmente pega o livro, lê e devolve”, conta. “São pouquíssimos os casos de pessoas que não devolveram os exemplares”, complementa.
Antônio faz uma comparação curiosa entre os coletivos e uma biblioteca. “Com o livro no ônibus, ali passa a ser também uma biblioteca, pois nela há estantes, livros e cadeiras, igual aos nossos carros”. Ele defende que os passageiros podem usar o tempo que gastam nos coletivos para relaxar com uma boa leitura.
Os colegas de trabalho se sensibi-lizaram com o projeto, e não faltam pedidos para que os livros sejam colocados também nos coletivos onde atuam. “Eles me pedem para colocar
uma estante de livros no carro deles. Alguns cobradores, inclusive, assinaram um termo para trabalharem como voluntários no projeto”, conta com orgulho.
Na opinião de Melissa Benter, a iniciativa trouxe mais cidadania para a população que utiliza o transporte coletivo da Piracicabana e o objetivo da empresa é alcançar cada vez mais usuários. Em média, 100 mil passageiros passam, por dia, pelos ônibus que possuem os livros.
Antônio se sente realizado com o sucesso do projeto e não tem medo de pensar alto. “Meu objetivo é expandir para todo o transporte coletivo do DF e conscientizar outros estados para que eles incentivem as empresas a colocar livros dentro dos ônibus para a população”. Ele também se candidatou a uma vaga no Conselho de Cultura do DF para defender o uso da literatura como incentivo à educação de crianças e jovens.